“Como está a minha qualidade de vida? Preciso de tudo isso para viver?”
Estas foram apenas algumas das muitas perguntas que o gaúcho Jorge de Mello, de 46 anos, hoje atuando como terapeuta, fez a si mesmo há 11 anos, quando resolveu largar o emprego em um banco e começar a disseminar o movimento batizado de Simplicidade Voluntária no Brasil. A idéia é questionar o estilo de vida da sociedade atual, muito centrado no consumo, e propor uma nova forma de viver.
“Estamos condicionados a ter status. Deixar de viver guiado pelos desejos e sim de acordo com minhas necessidades tornou-me uma pessoa muito mais rica”, revela o ex-analista de sistemas. Quando Jorge percebeu que a satisfação vinha de outras fontes, vendeu o carro e as duas motos, mudou por completo seu estilo de vida e criou o site www.simplicidade.net para dividir com os demais suas reflexões.
Em breves linhas, o Simplicidade Voluntária preconiza que o ser humano viva apenas com o necessário, nem mais, nem menos. Saber que não é possível um crescimento infinito em um mundo finito de recursos e, portanto, não se submeter ao interesses de um mercado cada vez mais voraz.
Ou seja, se é possível andar de bicicleta, poluindo menos o meio ambiente e ainda fazendo exercício, para quê carro? Se precisamos de poucas roupas e poucos objetos para ser feliz, por que encher armários e gerar a necessidade de comprar mais móveis para guardar tudo isso? E por aí vai...
Gostou da idéia? Então, é só começar. Claro que não precisa plantar uma horta no quintal, doar tudo que possui, e viver como um frade franciscano. Reciclar o máximo possível, evitar compras desnecessárias, dispensar sacolas plásticas nos mercados e reduzir gastos com eletricidade já bastam para começar.
Um dos primeiros a apontar a tendência foi o cientista político e historiador norte-americano Duane Elgin, que, nos anos 1980, publicou o livro “Simplicidade Voluntária”, no qual defende uma vida mais simples com uma vivência mais intensa.
Jorge explica que, em oposição ao consumismo desenfreado do mundo contemporâneo, a idéia está sendo disseminada em diversos pontos do planeta, em especial na Europa e Estados Unidos.
Seguindo esse pensamento, em alguns países existe o chamado Buy Nothing Day (Dia de não comprar nada) que conquista vários adeptos. O movimento propõe um dia inteiro de reflexão sobre a sociedade de consumo, com uma maratona cultural sem compras. A iniciativa começou no Canadá em 1992 e espalhou-se pelo mundo. No Brasil ainda fala-se pouco sobre o assunto.
Para adquirir o método de qualidade de vida, é preciso, antes de qualquer coisa, adotar voluntariamente o sentido simples de viver. Segundo Jorge, a escolha deve estar na vontade de ter liberdade individual.
Em suas palestras pelo país, o terapeuta sempre começa o bate-papo perguntando à platéia qual é a necessidade individual de cada um. Ele parte do pressuposto de que a sociedade vive hoje em função do consumo e não necessariamente daquilo que realmente precisa ou deseja.
Revolução pacífica
Na prática, e a despeito de sua própria história, Jorge conta que sua transformação não aconteceu do dia para noite – levou três anos para se adaptar às novas escolhas, desde que percebeu que lhe faltava alegria e liberdade.
Hoje sai com a família, toca violão, pinta aquarela, combina um encontro com os amigos para degustarem um fondue. Trabalha de acordo com suas necessidades, sem ter qualquer tipo de estresse. “Você se torna feliz com o que você tem. E não é uma questão de conformismo, é transformação em sabedoria”, explica. Muita gente, segundo Jorge, pratica essa filosofia de vida sem saber de que se trata de um movimento e de que há estudos sobre ela.
“Recebo um grande número de e-mails de pessoas que dizem que fazem isso e não sabiam que tinha nome. É uma coisa natural. Considero que tem uma revolução pacífica de cada pessoa”, conclui Jorge.
Matéria produzida para o site Bradesco Universitários em julho de 2008.