Há alguns anos, a grande conquista da vida de um jovem era passar no vestibular. Dali para frente bastava estudar, se formar, que o emprego surgiria, como resultado natural. Hoje as coisas mudaram bastante. Conseguir um estágio ou o primeiro emprego é muito mais difícil do que entrar para a faculdade, dizem especialistas.
As concorridíssimas seleções para programas de trainees - em que 2 mil candidatos chegam a concorrer a uma só vaga - estão aí para comprovar. Resultado disso é que os estudantes ou recém-formados se angustiam, tentando corresponder às exigências, devorando informações e regras sobre como enfrentar tais maratonas.
Para a psicóloga Irene Gentilli, que dá aulas em MBA de Gestão de Pessoas na Universidade de São Paulo (USP) e na Universidade São Marcos, os jovens, porém, devem parar de se angustiar e mudar a maneira de ver as coisas:
"A primeira coisa que costumo dizer é que não existe mais emprego. O emprego acabou. Existe trabalho", sentencia.
Segundo ela, o público universitário pode optar por dois caminhos: o emprego de carteira assinada, que vai ser para um número cada vez mais reduzido de pessoas, ou partir para abrir o próprio negócio, "ser empreendedor, fazer acontecer".
A angústia dessa idade, diz Irene, está relacionada a essa dificuldade de encontrar emprego - que nunca foi tão grande como agora e só tende a piorar - e também "ao problema do indivíduo que se pergunta a que veio no planeta".
"Sempre vai haver quem tenha vocação para o emprego, o executivo, aquele que quer sair às cinco da tarde", diz ela. Mas, segundo Irene, cada vez mais o jovem vai ter de buscar alternativas, olhar à volta, descobrir necessidades e buscar atendê-las de forma que obtenha reconhecimento.
"É preciso procurar o que se gosta de fazer, que o reconhecimento vem. E também os pais devem orientar e encaminhar seus filhos para áreas lucrativas", ensina.
Habilidade e competência
Irene Gentilli, que é mestra em comunicação pela Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP e especializada em psicologia clínica e organizacional, explica que o drama vivido pelo universitário que está ingressando no caminho profissional relaciona-se com a diferença entre habilidade e competência:
"Habilidade é como a carteira de habilitação do motorista, que me legitima para dirigir. Competência é a forma como vou usar essa habilitação adquirida: se eu dirijo rápido, cortando o trânsito, ou se vou devagar, colocando uma música para o meu passageiro", compara ela.
A habilidade seria, então, o diploma, enquanto que a competência é o que se faz com ele - e não necessariamente é aquilo que a faculdade ensinou.
Segundo a psicóloga, o jovem tem de parar de se depreciar por não conseguir o emprego que achou que deveria conseguir: "tem de parar de tomar ’tungada’, baixar a auto-estima e ser infeliz", exorta ela.
"É o empregador que não tem cacife. Os pais desses jovens foram criados para o emprego e ensinam isso a eles, mas hoje emprego é uma ’palavra-crime’. Temos de substituir emprego por trabalho", resume.
Recuperando o sentido de trabalho
Segundo a psicóloga, "trabalho é o brinquedo do adulto". Ela lembra que a criança saudável é aquela que está sempre em movimento, "arrepiando, interferindo no ambiente". Da mesma forma, o trabalho deve dar prazer ao adulto.
"Se você souber fazer algo muito bem, você vai vender bem sua idéia, vai encontrar quem precise dela e quem a compre", diz a psicóloga.
Muitas vezes o diploma é só um ponto de partida para se fazer algo totalmente diferente. Ela cita o exemplo do próprio filho, Duílio Gentilli, que cursou rádio e TV na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), em São Paulo, e hoje promove casamentos e é muito bem-sucedido.
Irene sugere que, se o jovem tem uma profissão como criar videogames, por exemplo, e tem medo de abrir o próprio negócio por não entender e não gostar de contabilidade, que se una a um outro que goste e tenha formação nesta área.
O importante, diz, é enxergar as oportunidades e buscar o que se gosta de fazer - que pode ser conquistado em equipe. Além de trabalho, conclui a professora, "parceria" é a palavra do momento.
Matéria produzida para o site Bradesco Univesitários em 24/10/2005.