O campo de animação no Brasil começa a ganhar mais espaço no mercado. Essa é a opinião de Marcos Magalhães, animador e um dos quatro idealizadores do hoje maior festival de animação das Américas (incluindo EUA e Canadá), o “Anima Mundi”.
Em 1982, quando foi premiado no festival de Cannes com o curta-metragem “Meow!”, sobre um gato manhoso que foi convencido a trocar leite por refrigerante, Marcos era um dos raros do seu ramo a atuar no país. Hoje, em parte por causa do “Anima Mundi”, que vem ajudando a formar público e também profissionais, já há bem mais gente produzindo desenhos animados no Brasil.
Só para dar um exemplo, a TV Rá Tim Bum, canal a cabo da Fundação Padre Anchieta dedicado ao público infantil, está lançando 19 séries de desenhos animados, todos produzidos na sede da TV Cultura, em São Paulo. Além disso, há o pioneiro estúdio Mauricio de Sousa Produções, às voltas com o longa-metragem em 3D do personagem Horácio.
Já há algum tempo o talento para animação dos brasileiros é conhecido de grandes estúdios internacionais. Há vários profissionais lá fora, entre eles Carlos Saldanha, um dos responsáveis por sucessos como “A Era do Gelo”.
Magalhães foi um dos primeiros animadores-empreendedores brasileiros. Ainda quando estudava arquitetura, ele tinha duas animações em 35 mm prontas. Conseguiu uma bolsa de estudos para o National Film Board, instituto no Canadá que promove filmes de animação. Queria estudar com Norman Mc Laren, um dos grandes nomes dessa arte.
Voltando do exterior, ele foi premiado em Cannes. “O prêmio gerou visibilidade para a animação, pessoas souberam que existiam animadores no Brasil”, comenta.
Na época, a extinta Embrafilme o convidou para coordenar o núcleo de animação que estava sendo criado. Foi no Centro Técnico Audiovisual (CTAV) que os primeiros animadores nacionais começaram. Da turma de dez alunos de Magalhães, três saíram seus sócios no empreendimento de montar o festival de animação, Aida Queiroz, Léa Zagury e Cesar Coelho.
De lá para cá, o festival cresceu muito e com as novas tecnologias, ganhou novos braços: o “Anima Web”, o “Anima Celular” e o “Anima Escola”. Este último, um programa que ensina a linguagem da animação nas escolas, seja com desenhos, bonecos de massa de modelar ou mesmo usando o próprio corpo (pixilation).
Para ajudar nessa missão, a equipe do festival desenvolveu um software livre chamado Muan que facilita não só a vida dos animadores, como também dos professores. É uma ferramenta que desmistifica o processo de criação de uma animação.
“O Muan funciona como um ‘pencil-test’, ele captura a sequência de imagens fixas e a reproduz imediatamente, assim o animador pode perceber se falta algum desenho na sequência”, explica Magalhães. Em sala de aula serve para o professor mostrar de forma rápida e fácil como uma animação é criada.
O interesse por novas e diferentes tecnologias sempre norteou o trabalho de Magalhães, que, em seu último curta, “Homem Estátua”, animou desenhos de alunos seus numa disciplina eletiva de desenho de modelo vivo, integrante do curso de desenho industrial da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio.
“Fiz a experiência de criar uma unidade a partir dos vários estilos de desenho e deu super certo. A partir daí eu pensei numa história em que pudesse usar isso”, conta o animador.
Admirador da Disney e Pixar “por serem virtuoses da sua técnica”, ele também gosta de trabalhos de japoneses que fazem PikaPika, uma técnica de animação a partir de luzes de lanternas. Cita os grafites animados – sequências de 24 fotos de desenhos grafitados postos em movimento - como novidades recentes animadoras, com duplo sentido.
“No ‘Anima Web’, recebemos muitos filmes feitos por iniciantes, o que me interessa pessoalmente”. Ele explica que pela falta de vícios dos realizadores às vezes surgem produções inovadoras. Como a web elegeu o flash como plataforma, o “Anima Web” e “Anima Celular” também o utilizam. Uma ferramenta simples que estimula quem nunca se arriscou na animação antes a produzir.
A animação se prolifera por quase toda produção audiovisual hoje, até mesmo documentários se servem dela. Storyboard, letreiros de apresentação, créditos e manipulações nas imagens são na essência animações.
Para Marcos, é gratificante ver que as animações são cada vez mais usadas em projetos de empresas. Ele conta que está desenvolvendo um projeto para o Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) e observa que a demanda do mercado de trazer a animação para exemplificar conteúdos vem crescendo.
“No Iphan estamos usando a animação como uma forma de passar informação aos funcionários”, exemplifica.
O festival brasileiro
A primeira e tímida edição do festival do “Anima Mundi” foi em 1993, no Rio de Janeiro, e desde o início o mote era não só informar o espectador, como contribuir com sua formação. Diversos workshops são oferecidos desde então para o público. Essa iniciativa foi sem dúvida uma das responsáveis pela popularização da animação, que faz cada vez mais conquistas no Brasil.
Em julho último, a 16ª edição do festival reuniu cerca de 100 mil espectadores no Rio e em São Paulo. Para efeito de comparação, Annecy, um dos festivais de animação mais respeitados do mundo, que acontece na cidade de mesmo nome na França, vendeu no último ano 115 mil ingressos.
“Em geral, os festivais são voltados para o público especializado. Esse incentivo à participação do público nos moldes como é feito hoje é um grande diferencial do evento brasileiro”, diz Marcos Magalhães.
A próxima edição do “Anima Mundi” será de 10 a 19 de julho no Rio e de 22 a 26 de julho em São Paulo. Vale a pena dar uma olhada no site www.animamundi.com.br e ver como você pode participar.
Matéria produzida para o site Bradesco Universitários em abril de 2009.