Reconhecer a melodia ou a letra de ''Asa Branca'' é tarefa simples para qualquer brasileiro. Mas quem saberia dizer o autor dessa canção, considerada uma das mais populares do país? Humberto Teixeira é o nome dele, parceiro por quase toda a vida de Luiz Gonzaga, o mais famoso representante do baião.
A história desse homem, oculto aos olhos de muitos, se mistura com a história desse estilo musical. É isso que mostra o documentário de Lírio Ferreira, ''O homem que engarrafava nuvens'', em cartaz nas salas de cinema de todo o país.
''Para mim, é na música que está a raiz de um povo, a sua cultura – e não no teatro ou no cinema, por exemplo'', afirma Ferreira, que acredita que o documentário é um registro do povo para o próprio povo. Convidado pela produtora, também atriz e filha de Humberto Teixeira, Denise Dummont, o diretor de raízes nordestinas conta que não pensou duas vezes antes de aceitar a proposta.
''Queria descobrir quem era papai, pois nem eu mesma sabia. Daí surgiu a ideia de fazer um documentário'', revela Denise, que há nove anos começou a levantar material e fazer as pesquisas para a produção. Depois de três anos envolvida com o projeto, decidiu chamar o diretor para ''fazer tudo direito''.
Ao todo, foram cerca de 70 horas de material, incluindo as filmagens e o acervo levantado, resumidos em pouco menos de duas horas. ''Ainda tem muita coisa que não entrou. Temos projetos para futuros DVDs, porque isso é muito valioso para ser perdido, mas por enquanto queremos trabalhar na divulgação do filme'', ela conta.
O diretor revela que, com tanto material e tantas surpresas que foram surgindo entre depoimentos ou vídeos descobertos, o roteiro do documentário só foi definido na hora da edição. ''Esse é um filme de montagem'', ressalta.
O resultado é o encontro de feras da música brasileira de todos os tempos. Nomes como Gilberto Gil, Belchior, Caetano Veloso, Os Mutantes, Zeca Pagodinho, Gal Costa, Sivuca, Raimundo Fagner, Cordel do Fogo Encantado, Lenine, Maria Bethânia, Elba Ramalho, Alceu Valença, Otto, entre muitos outros, aparecem interpretando as canções de Humberto - que foram mais de 400 - e falando sobre sua música.
Música que para Denise não é apenas de Humberto, é de todos. ''Creio que cada brasileiro é um pouquinho filho dele'', comenta. Para descobrir a vida de seu pai e compartilhá-la com o público, depoimentos de amigos e parentes do autor foram recolhidos por ela mesma em uma jornada pelo país a fora.
Além disso, registros em vídeo da vida de Humberto - incluindo uma conversa regada a cerveja entre o próprio e Luiz Gonzaga - estão no documentário. De olhos mareados e sorriso no rosto, o público pode aguardar por imagens surpreendentes, como as de Grande Otelo e Carmem Miranda. O que eles têm em comum com Humberto Teixeira e o baião? Só assistindo para saber.
A garrafa de nuvens
O título do documentário é perfeito para representar um homem que, em meio ao povo nordestino, sofrido e judiado pela seca, conseguiu recolher o que havia de água no céu e guardar em garrafas que pudessem matar a sede.
De certa forma, era isso que Humberto Teixeira fazia, transformando suas poesias melódicas na riqueza de um povo humilde e na maneira mais cativante de se contar as histórias tristes e verdadeiras do sertão.
Mas Denise conta que o título veio mesmo de uma frase que seu pai costumava dizer no fim da vida, quando morava no Rio de Janeiro, em São Conrado, entre os vales da região.
''Já cansado, ele preferia agora ficar em casa, e como havia muitas nuvens que baixavam pertinho, ele dizia aos outros que ficaria por ali, comigo, engarrafando nuvens'', ela relembra.
Para saber mais:
www.ohomemqueengarrafavanuvens.com.br
Matéria produzida para o site Bradesco Universitários em 15/01/2010